quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A águia e o galinheiro.

Oi pequena águia.
Vejo que nasceste em um galinheiro. Que lugar estranho de se encontrar uma pequena águia!
Como esta vida tem te tratado?
Difícil?
Sofres com as chacotas das galinhas, com as privações que te são impostas, com o riso debochado – o cacarejo -, com tua liberdade minúscula, com as críticas destrutivas que anseiam por chegar aos teus ouvidos, com as intrigas, com o cerco constante que objetiva a manutenção de tua prisão invisível, com as agressões físicas que nada são comparadas com as constantes agressões psicológicas.
Percebo bem teu sofrimento. Não preciso que me contes, me mostre. Aliás, nem preciso ver muito. Não te preocupes, percebo teu sofrimento.
Saibas que o fazem por inveja. Sim, as galinhas te invejam.
“Por que haveriam de invejar-me?” me perguntas. “Não tenho nada demais, não sou nada demais. Pelo contrário, sou muito inferior a estas galinhas!”.
É onde engana-te, pequena águia. Engana-te tanto quanto seria possível que alguém possa estar enganado!
Estas galinhas invejam-te, tenha certeza! Pois elas enxergam muito além do que teus pequenos olhos podem ver. Estas galinhas sabem muito sobre sina. Sabe que não podem mudar o que são, para sempre serão galinhas. Assim como sabem que para sempre tu serás uma águia.
Mas não se conforma com isto! Não acham que merecem ser apenas galinhas. Não acham que tu mereces ser uma águia.
Desejosas de mudar o futuro, de manipular as sinas para satisfazerem suas próprias vontades, resolvem que, se não podem elevar-se da condição de galinha, que, ao menos, tu não possas jamais alcançar teu elevado destino.
Então dedicam suas vidas a convencer-te de mentiras. Convencer-te de inferioridade, insignificância, de hierarquia. Convencer-te de lodo.
Tais galinhas jamais encontrarão felicidade em suas existências minúsculas. Ignoram o fato de que podem sim elevarem-se. Que podem modificar a própria sina e tornarem-se grandiosas. E o que há de errado em ser uma galinha grandiosa? Não é vergonha alguma.
Porém sequer consideram a existência de tal possibilidade. A busca por crescimento se faz muito trabalhoso para mentes minúsculas. Tão mais ao alcance da mão é reduzir alguma existência superior.
Mais ao alcance da mão, sim. Satisfatório, jamais. Enganam-se constantemente de que isto as trará a felicidade que acreditam merecer. A felicidade não vem. Pelo contrário, afundam pouco a pouco no lodo que criaram especialmente para ti. Mas não percebem! Continuam a afundar. Afundar e se enganar.
Com o passar do tempo nem todos os esforços de todas as galinhas do mundo bastarão para castrar-te. Crescerás e inevitavelmente tomarás conhecimento (mesmo que reduzido) de sua própria natureza.
Crescerás e aprenderás a estufar o peito e a alçar vôo mesmo no lodo. Enquanto isto, as galinhas, que cada vez mais se atolam no lodo, percebem que não podem fazer o mesmo que tu fazes. Acabam por encontrarem cada vez mais dificuldade de sobreviverem nas armadilhas que criaram para te prender.
E, um dia, tu alçarás vôo e deixará para sempre este ninho que tanto trabalhou para te tornar as asas curtas. Poderás, então, voar livremente na altura que bem desejares. Afinal, és uma águia!
Eu imagino o que estejas a pensar, pequena águia. “Como ele poderia saber destas coisas? De certo inventa o que fala! Impossível que veja tanta coisa com tanta clareza enquanto eu não vejo nem uma mínima porção do que fala! Como poderias ver o que diz ver?”.
Ah, a resposta é bem mais simples do que possas imaginar, pequena águia! Ora, não percebes que também sou uma águia? Que consigo perceber um membro de minha espécie? Que também tive meus dias de galinheiro? Que, do meu vôo alto consigo enxergar infinitamente mais que estas galinhas ou que tu enxergas com esta tua venda?
Ora, minha pequenina, percebes quem eu sou? Quem nós somos? Percebes para que estou aqui? Percebes meu papel nesta história?
Eu sou aquele que veio te estender a mão, te ajudar a sair do galinheiro e que te empurrarás do abismo de onde tu certamente te erguerás triunfante apoiada meramente na tua confiança e nas tuas asas.
Voe, minha cara.




Postado por Ricardo Ceratti (inspirado no texto da águia no galinheiro).

Nenhum comentário: