quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Ajudar.

Estava chegando num mercadinho perto de casa e sou abordado por uma guriezinha duns quatro anos.
Me pediu se eu compraria pão e leite.
Acostumado com pedintes, mendigos, drogados e flanelinhas, pus um "não" na ponta da língua.
Mas na hora de verbalizá-lo refleti: Ela não está me pedindo dinheiro e sim comida. Não me chamou de mano. Não deixou implícito que ia riscar meu carro ou que minha integridade física estaria em jogo. Não chegou com bafo de cachaça nem de loló. Não tentou intimidar. Não contou uma histórinha, nem dramatizou a situação (que eu sei que é dramática em boa parte das vezes). Não agiu como se fosse minha obrigação dar alguma coisa para ela. Não pediu isso em troca de cuidados imaginários de alguma propriedade minha. Não pediu dizendo que ia comprar comida, ou admitindo que ia comprar drogas.
Só pediu. Pediu com educação. Com aquela educação que não precisa de dinheiro ou de escola para ter. Com respeito. Nem se colocando como inferior, nem como superior. Pediu como igual que é.
Eu disse que compraria uns pães para ela e que me esperasse pois eu ia demorar um pouco, pois tinha minhas compras a fazer.
Me preocupei dela estar ali sozinha, mas me falou que estava com a mãe. Sua mãe não estava jogada na sarjeta, não estava pedindo esmola, não estava sob efeito de drogas, não estava roubando, nem nada. Sua mãe estava trabalhando de juntar coisas para reciclagem, ou, popularmente, era papeleira.
Dei pães, mortadela e bergamotas numa quantidade que sabia que elas duas matariam a fome pelo menos até a próxima noite (se não mais).
E então me dei conta. Não chegou a me custar 3R$. TRÊS REAIS!
Sério, sabendo comprar dá para conseguir alimentar-se com muito pouco dinheiro.
As frutas em dia de feira (no caso, hoje), eram quase de graça.
Comprei coisa para me alimentar durante a semana inteira E as compras para a guriezinha e sua mãe e o total me custou em torno de 15R$.
Agora pense. Quantas vezes se dá esmola em semáforos, para pedintes nas calçadas, parques, para os flanelinhas? Quanto se dá?
Muitas vezes damos quantidades realmente próximas do quanto gastei para ajudá-las.
E qual a utilidade disso? Todos sabemos para onde vai esse dinheiro.
Faça seu dinheiro e sua ação valer. Dê alimento para ajudar a pessoa, mas não dê este coringa que a qualquer fim pode ser utilizado.




Postado por Ricardo Ceratti (com seu estoque de frutas, legumes e verduras).

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Convulsões na sociedade.

Ao assistir este vídeo (http://vimeo.com/27659191) fui obrigado a falar algumas coisas:

O que, ao meu ver acontece?
A mera existência de modos de vida diferente, que podem dar certo e deixar a pessoa realizada, é em si uma ameaça para a estrutura atual em que nos inserimos (estudar, trabalhar, ser explorado, comprar... ou não estudar, trabalhar mais, ser infinitamente mais explorado, e comprar).
Não existe problema algum que alguém saia deste modo de existência, desde que sejam removidos da sociedade fisica ou psicologicamente. Mendigos não são problema, pois ninguém vai deixar de ser explorado na sua força de trabalho para consumir bastante para ser um mendigo. E os tão chamados "loucos" não são problema também, pois são removidos da sociedade através de clínicas, hospícios ou doses debilitantes de remédios. Bandidagem de baixo nível também não se constitui numa ameaça séria, uma vez que influencia uma quantidade muito pequena de membros produtivos da sociedade a buscarem esta forma de vida, se comparado com o imenso ganho social que existe em sua existência, que é gerar medo (e é o medo que nos leva a nos mantermos nesse status quo, a querermos um governo, uma polícia, a pagarmos segurança privada, a comprarmos muitas coisas para nos distrairem da realidade em nossos lares ou "gadgets").
O problema se dá quando vemos pessoas sobreviverem de fazer o que gostam, sem enlouquecerem, sem viverem de uma forma (percebida pelos mesmos como) miserável, de não precisarem entrar no ciclo exploração/consumo.
Já pensou que má influência? Já pensou se todo mundo decide fazer o que gosta e comprar só o que precisa? Se todo mundo achar a idéia bacana e passar a viver assim.
Já pensou?
A sociedade, estruturada da forma em que se encontra atualmente, simplesmente desmorona.




Postado por Ricardo Ceratti.